SE A JUSTIÇA NÃO SERVE AOS FRÁGEIS, NÃO SERVE PARA NADA

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15 de junho de 2025
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Por Sammy Chagas

Em uma sociedade marcada por desigualdades históricas e estruturais, a justiça só tem sentido se for instrumento de equilíbrio e proteção. Não para os poderosos, que já possuem meios para se fazer ouvir, mas para aqueles que estão nas margens: os pobres, os vulneráveis, os esquecidos pelo sistema. A viúva que clama por um direito negado. O órfão ignorado pelo Estado. O morador de rua invisível à política pública. É por essas pessoas que a justiça precisa existir.

Se a balança da Justiça não pesar com mais sensibilidade para o lado dos oprimidos, ela deixa de ser justiça e se transforma apenas em ritual — uma formalidade fria a serviço da manutenção do poder. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, diz o artigo 5º da Constituição Federal. Mas o que significa essa igualdade, se não for acompanhada de uma ação concreta que reconheça as desigualdades e proteja justamente os mais fracos?

Rui Barbosa, jurista e pensador brasileiro, já alertava:

“A justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta.”
E mais do que isso: justiça seletiva também não é justiça — é cumplicidade com o poder que oprime.

Quem tem poder se impõe. Impõe sua fala, seu espaço, sua agenda. Por isso, o papel do sistema de justiça é frear os abusos, limitar os excessos e dar voz àqueles que, sem essa instituição, seriam completamente silenciados. A justiça é o grito institucional de quem não pode gritar. Ela deve se colocar como muralha contra a opressão e como ponte para a dignidade.

Norberto Bobbio, filósofo italiano, escreveu que:

“A grande tarefa do nosso tempo é transformar os direitos formais em direitos reais.”
E essa transformação exige um Judiciário comprometido não com a neutralidade cega, mas com a equidade lúcida — aquela que enxerga onde estão as feridas mais profundas e atua para curá-las.

A Constituição de 1988 não foi escrita para os donos do poder. Foi feita, sobretudo, “para construir uma sociedade livre, justa e solidária” (art. 3º, inciso I). Isso não é retórica: é um mandamento constitucional. Uma diretriz de Estado. Se essa Constituição ainda pulsa, é porque há quem lute para que a justiça cumpra esse papel de equilíbrio, proteção e reparação.

A justiça não pode ser luxo. Ela precisa ser abrigo. E se ela não for o último recurso dos desvalidos, se não for o escudo dos que não têm voz, então de que vale o seu aparato, seus tribunais, suas togas?

Sem justiça para os frágeis, não há justiça. Há privilégio. E privilégio não é justiça.

 

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