
ENQUANTO VOCÊ ROLA O CELULAR, A VIDA TÁ PASSANDO LÁ FORA. CONTEMPLE
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04 de junho de 2025Entre o barulho das notificações e o silêncio das borboletas, há um mundo esperando por nossos olhos
Dias atrás, ao rolar mecanicamente o feed de uma rede social, me deparei com uma publicação simples, quase silenciosa em meio ao caos visual da internet. Ela dizia apenas: “Contemple.” Não havia mais nada. Nenhuma explicação, nenhuma imagem chamativa. E, ainda assim, aquilo me paralisou por dentro. Como se, por alguns segundos, uma voz mais antiga — talvez a alma — me lembrasse que existe vida fora da tela.
Quantos de nós ainda sabem contemplar?
Não falo de ver. Ver, todos vemos. Ver virou obrigação. A tela do celular nos exige olhos atentos, dedos ágeis, mente inquieta. Mas contemplar… ah, contemplar é outra coisa. É ato de coragem em tempos digitais. É revolução silenciosa. É resistência.
Contemplar é parar o mundo só para ouvir o som do vento.
É olhar demoradamente para o rosto dos filhos e perceber que eles crescem — e que muitas vezes estamos ausentes mesmo estando perto. É observar o caminho que fazemos todos os dias como se fosse a primeira vez. Reparar nas calçadas, nos detalhes das fachadas, nas pessoas que se repetem ao nosso redor sem que as notemos. O homem que vende frutas na esquina. A senhora que rega as plantas da varanda. O menino que caminha com a mochila nas costas e o fone no ouvido.
Contemplar é sentar no banco da praça sem pressa.
É deixar o celular no bolso e olhar para o céu, perceber as nuvens dançando ao ritmo do vento. É se encantar com uma árvore antiga, com uma flor pequena nascendo no meio da calçada. É acompanhar com os olhos o voo de uma borboleta. É assistir à chuva cair e, em vez de reclamar, agradecer pela água que alimenta a vida.
Quantos de nós ainda sabem ouvir uma música e dançar?
Não para gravar um vídeo. Não para mostrar aos outros. Mas dançar para si mesmo. Porque o corpo pede. Porque a alma canta. Porque a vida merece ser celebrada com o corpo inteiro. Quantos de nós ainda sabem olhar nos olhos durante uma conversa? Desligar-se das notificações, dos alertas, das urgências fabricadas — e se conectar, de verdade, com quem está à frente?
Você já contemplou o seu dia hoje?
Já respirou fundo na porta de casa? Já reparou na textura do chão, no som da vizinhança, na brisa que balança as folhas? Já contemplou a sua própria presença no mundo — esse mistério que é estar vivo?
Não se trata de negar a tecnologia.
Ela é ferramenta, não destino. Mas precisamos lembrar que não somos máquinas. Não somos produtos. Não somos algoritmos. Somos feitos de carne e espírito. De lágrima e riso. De saudade e esperança. Somos humanos — e isso significa que somos capazes de sentir o invisível, de perceber o que escapa aos olhos apressados, de tocar com o olhar aquilo que a pressa torna irrelevante.
Contemplar é olhar para dentro.
É reencontrar Deus nos detalhes. É perceber que Ele está no voo dos pássaros, no abraço de um filho, no silêncio do fim de tarde, no cansaço digno de quem trabalhou o dia inteiro, no sorriso tímido de quem pouco tem, mas ainda assim agradece.
O mundo não vai parar. Mas você pode.
Pare. Sente na calçada. Feche os olhos. Respire. Olhe ao redor. Veja onde Deus te plantou. Perceba a beleza que há no agora. E então, contemplando o simples, você vai lembrar que a vida ainda vale a pena — e que ela não acontece nas telas, mas no coração das coisas vivas.
Já ligou para um irmão hoje? Já perguntou como ele está, mesmo sem um motivo especial? E sua avó, seu avô, sua mãe, seu pai — já ouviu a voz deles hoje? Já pegou o telefone só pra chorar, dividir um silêncio, pedir colo à distância? Já ligou dizendo “bença, pai”, “bença, mãe”, como nos tempos de antes, quando esse gesto simples carregava respeito, amor e saudade? Faça uma ligação agora. Não precisa ser longa. Diga apenas: “Liguei só para saber como você está… só para dizer que te amo.” Parece simples, mas pode ser o abraço que o outro precisava no dia de hoje. Faça essa experiência — e descubra como um telefonema pode reacender o que realmente importa.
Contemple. Porque contemplar é, antes de tudo, amar.