
Causa indígena se esvazia no Extremo Sul como rio poluído pela violência
-
21 de março de 2025Conflito entre indígenas, produtores rurais e criminosos expõe manipulação da causa por facções infiltradas na região
No Extremo Sul da Bahia, onde o verde da mata atlântica ainda tenta resistir e os rios desenham caminhos antigos sobre a terra, um novo fluxo tem corrido com mais força do que as águas: o da violência. O que deveria ser uma luta legítima dos povos originários pela retomada de suas terras ancestrais está sendo contaminada por agentes externos, criminosos que se apropriaram da narrativa indígena como disfarce para ações ilícitas.
A metáfora que melhor representa a atual situação talvez seja a de um rio. O rio, quando nasce, tem propósito: regar, alimentar, fazer florescer. Ele tem destino, curso, serventia. Mas, quando é poluído, ele não deixa de ser rio. Sua essência continua lá. No entanto, torna-se estéril. Peixes não sobrevivem, a água não sacia, a vida se afasta. Ainda é rio, mas já não serve. Assim está a causa indígena na região: poluída.
Essa poluição não vem da natureza, mas da ação humana — de criminosos que, aproveitando a pauta legítima das comunidades indígenas, se infiltram, se disfarçam, cooptam lideranças ou se dizem parte da etnia. Invadem terras, fazem reféns, ameaçam produtores, e, com isso, esvaziam a nobreza de uma luta histórica. A causa, como o rio poluído, perde vida. Torna-se instrumento de manipulação, e não mais de justiça.
Produtores rurais vivem sob tensão, comunidades indígenas são confundidas com facções, e o Estado assiste, em muitos casos, com hesitação ou silêncio. O problema, então, se torna ainda mais profundo: a poluição não é só visível, ela é sistêmica. Mistura o medo com o abandono, a causa com o crime, e a verdade com a narrativa forjada.
A retomada do curso natural desse “rio” exige filtragem — separação da legítima luta indígena da atuação criminosa. Não se trata de negar a existência do conflito fundiário, mas de reconhecer que, hoje, a presença do crime organizado tem transformado a paisagem. E se não houver ação firme e inteligente, o que deveria irrigar a justiça continuará afogando a esperança de todos os que vivem naquela terra.