“Brasil, mostra tua cara”: remake de Vale Tudo reacende o debate sobre a honestidade elástica do brasileiro

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30 de março de 2025
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Por Sammy Chagas | Coluna de Opinião

Estreia nesta segunda-feira, 31 de março de 2025, o remake de uma das novelas mais emblemáticas da teledramaturgia nacional: Vale Tudo. A nova versão, adaptada por Manuela Dias, traz à tona uma discussão que atravessa gerações — vale a pena ser honesto no Brasil? — e, mais do que nunca, reacende o espelho social que o brasileiro muitas vezes evita encarar.

Na primeira versão, exibida em 1988, o embate entre Raquel Accioli e sua filha Maria de Fátima expôs com crueza o conflito moral entre integridade e ambição. Agora, com Taís Araújo no papel de Raquel e Bella Campos como a oportunista Maria de Fátima, a trama é atualizada para refletir o Brasil de 2025, um país ainda marcado por contradições, desigualdades e um moralismo seletivo.

Odete Roitman — interpretada agora por Débora Bloch — segue como símbolo da elite arrogante, que despreza os valores nacionais e trata a corrupção como uma ferramenta de poder. No entanto, o remake amplia essa crítica para além dos gabinetes e mansões. A desonestidade não mora apenas em Brasília ou nas altas rodas. Ela está na esquina, no escritório, no trânsito, no caixa do supermercado. Está no gesto “pequeno” de furar uma fila, de sonegar um imposto, de estacionar em vaga de idoso. Está no jeitinho.

É aqui que entra o verdadeiro impacto da novela: a exposição da honestidade elástica que tantos praticam sem perceber. Uma moral que se adapta conforme a conveniência, que exige ética dos outros — principalmente dos políticos —, mas ignora as próprias transgressões. Um tipo de caráter que cobra o “fim da corrupção”, mas fecha os olhos para a fraude no benefício, para o atestado falso, para a propina disfarçada de favor.

A trilha sonora segue com o clássico “Brasil”, de Cazuza, na voz inesquecível de Gal Costa. A letra segue atual: “Brasil, mostra tua cara! Quero ver quem paga pra gente ficar assim…”. O grito que ecoava nas casas em 1988 volta a soar nos lares de 2025. E a pergunta segue sem resposta — ou melhor, com uma resposta incômoda: somos parte do problema?

Ao trazer novamente essa história ao horário nobre, a Globo não apenas presta homenagem a um clássico, mas desafia o telespectador a sair da passividade. A nova Vale Tudo não se limita a denunciar a corrupção sistêmica; ela convida à autorreflexão. Afinal, a corrupção só se mantém viva porque encontra conivência no cotidiano. E muitas vezes, o maior escândalo mora ao lado — ou dentro de nós mesmos.

No fim, a pergunta permanece, ainda mais necessária: no Brasil de hoje, ainda vale tudo? Ou chegou a hora de encarar a nossa própria cara e, enfim, mudá-la??

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